Eu quase votei
Não sou cidadã dos Estados Unidos da América, mas, hoje, quase votei. Phillip Jackson, um agente educativo comunitário que conheci em Bronzeville, o coração negro de Chicago, convidou-me a acompanhar a sua ida às urnas, na secção de voto dos Lincoln Perry Apartments. Mas nunca pensei que passasse da porta ou, vá lá, da mesa de voto. Duas senhoras descomunalmente obesas procuravam nos cadernos os nomes dos eleitores e arrancavam metade da ficha quando estes apareciam para votar. Conheciam bem Phillip, que levou donuts e café para todos. Todos vivem no bairro para onde vieram muitas famílias descendentes de escravos nos anos 1920/30, fugidas ao Sul mais segregacionista e racista.Estávamos, portanto, no bairro histórico negro de Chicago – e ninguém escondia isso, nem mesmo dentro da secção de voto. Apesar de na parede estar afixado um quadro com regras e uma delas ser abster-se de manifestações sobre os candidatos ou as eleições, ouviam-se muitos "Obama". Phillip optou pelo voto electrónico e, surpresa das surpresas, eu fui autorizada a ir com ele até à máquina e, mais ainda, fotografá-lo enquanto votava. Cruz em Obama/Biden, nos senadores, nos congressistas. Já vamos na página três do ecrã e surge uma lista infindável de representantes do Estado – juízes, notários, etc…Isto tudo e ainda faltavam dois referendos: um, recorrentemente chumbado, sobre alterar a Constituição; outro sobre obrigar o município a reservar 26 por cento dos terrenos do bairro para construções a preços acessíveis. Há 1800 lotes por ocupar em Bronzeville e muitas casas estão à venda por um milhão de dólares para cima. Phillip Jackson diz que essa "especulação imobiliária" vai aumentar os impostos e obrigar muitas famílias de baixos recursos a saírem do bairro. Além disso, de acordo com o plano municipal, muitos dos edifícios serão demolidos no prazo de dois anos. O investidor imobiliário Peter Payne confirmou que "muitas pessoas terão que sair" do bairro, mas frisou que poderá haver uma solução integrada, com opções para os mais pobres ficarem no bairro onde sempre viveram. "Não podemos tirar daqui toda a gente", realça. Nos lotes em construção, em que um estúdio poderá vir a custar 750 mil dólares, os futuros compradores que aparecem nos cartazes publicitários são ou brancos ou chineses – quando o bairro é maioritariamente "african-american" e (menos) "latin-american".
Sofia Branco
Não sou cidadã dos Estados Unidos da América, mas, hoje, quase votei. Phillip Jackson, um agente educativo comunitário que conheci em Bronzeville, o coração negro de Chicago, convidou-me a acompanhar a sua ida às urnas, na secção de voto dos Lincoln Perry Apartments. Mas nunca pensei que passasse da porta ou, vá lá, da mesa de voto. Duas senhoras descomunalmente obesas procuravam nos cadernos os nomes dos eleitores e arrancavam metade da ficha quando estes apareciam para votar. Conheciam bem Phillip, que levou donuts e café para todos. Todos vivem no bairro para onde vieram muitas famílias descendentes de escravos nos anos 1920/30, fugidas ao Sul mais segregacionista e racista.Estávamos, portanto, no bairro histórico negro de Chicago – e ninguém escondia isso, nem mesmo dentro da secção de voto. Apesar de na parede estar afixado um quadro com regras e uma delas ser abster-se de manifestações sobre os candidatos ou as eleições, ouviam-se muitos "Obama". Phillip optou pelo voto electrónico e, surpresa das surpresas, eu fui autorizada a ir com ele até à máquina e, mais ainda, fotografá-lo enquanto votava. Cruz em Obama/Biden, nos senadores, nos congressistas. Já vamos na página três do ecrã e surge uma lista infindável de representantes do Estado – juízes, notários, etc…Isto tudo e ainda faltavam dois referendos: um, recorrentemente chumbado, sobre alterar a Constituição; outro sobre obrigar o município a reservar 26 por cento dos terrenos do bairro para construções a preços acessíveis. Há 1800 lotes por ocupar em Bronzeville e muitas casas estão à venda por um milhão de dólares para cima. Phillip Jackson diz que essa "especulação imobiliária" vai aumentar os impostos e obrigar muitas famílias de baixos recursos a saírem do bairro. Além disso, de acordo com o plano municipal, muitos dos edifícios serão demolidos no prazo de dois anos. O investidor imobiliário Peter Payne confirmou que "muitas pessoas terão que sair" do bairro, mas frisou que poderá haver uma solução integrada, com opções para os mais pobres ficarem no bairro onde sempre viveram. "Não podemos tirar daqui toda a gente", realça. Nos lotes em construção, em que um estúdio poderá vir a custar 750 mil dólares, os futuros compradores que aparecem nos cartazes publicitários são ou brancos ou chineses – quando o bairro é maioritariamente "african-american" e (menos) "latin-american".
Sofia Branco
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